
27 Apr CÂNDIDO JACOB: GUITARRAS ÚNICAS E PERSONALIZADAS – entrevista para a Magnética Magazine
CÂNDIDO JACOB: GUITARRAS ÚNICAS E PERSONALIZADAS
Cândido Jacob sempre foi fascinado pela música e foi um problema na guitarra que o fez dedicar-se à pesquisa sobre a sua reconstrução e arranjo. Em 2011 teve o seu primeiro contato com a construção de instrumentos, seguiu para Paris e hoje em dia dedica todo o seu tempo às guitarras. Visitem o seu site e leiam a entrevista com o luthier:
Cândido, como e quando surgiu a paixão pela música? O que o levou a querer criar instrumentos de cordas?
Não sei exactamente quando surgiu uma paixão pela música. Creio que desde sempre que sou apaixonado por melodia e ritmo. Para complementar o gosto pela musica, o meu pai inscreveu-me numa escola de música quando tinha 7 anos para aprender teclado e a partir desse momento a música tornou-se parte do meu dia-a-dia.
Sempre tive curiosidade em saber como são construídas e como funcionam as guitarras acústicas, no entanto, nunca tinha feito nenhum tipo de intervenção, além de mudar cordas de vez em quando. No momento em que tive um problema estrutural na minha guitarra e não sabia como resolvê-lo, pus-me a pesquisar sobre construção e reparação de guitarras, comecei a comprar livros, a ver vídeos e a tirar notas sobre construção. Quando dei por mim estava a despedir-me do meu trabalho para me dedicar à construção de guitarras.
Como aprendeu esta arte? Há quanto tempo trabalha na criação de instrumentos?
Comecei a minha aprendizagem na oficina do Fernando Meireles, em Coimbra, entre 2011 e 2012. Foi na sua oficina que tive o primeiro contato com a construção de instrumentos. Aqui aprendi diversas técnicas ancestrais para trabalhar os materiais (madeira, osso, etc.) e para fazer a minha própria cola e verniz, elementos que por si ajudam a tornar o instrumento mais rico, tanto a nível sonoro como estético! Entre 2012 e 2013 fui para Paris e passei quatro meses na oficina do Luthier Ludovic Barrier, onde aprendi outro tipo de construção (guitarras Archtop) que acabou por complementar a aprendizagem inicial. No verão de 2013 decidi aventurar-me e seguir este caminho sozinho.
São vários os instrumentos de cordas. Está dedicado a algum deles em especial? Porquê a preferência?
A minha actividade como construtor é direcionada maioritariamente para a construção de guitarras acústicas de cordas de aço, guitarras estreitamente relacionadas com o Blues e o Folk! A preferência por este género de guitarra talvez seja explicada pela paixão e admiração que tenho pela sonoridade, talvez por ser a sonoridade que sempre me cativou, ou talvez porque é a guitarra que mais gosto de tocar! Dentro desta sonoridade, construo também guitarras do estilo Weissenborn (lapsteel acústicas) que são conhecidas pela sua peculiar sonoridade e bastante popularizadas pelo Ben Harper.
Ocasionalmente também vou construindo outro tipo de guitarras acústicas (guitarras clássicas, cigar-box guitar), dependendo do projecto e desafio que me forem apresentados.
É possível explicar o processo de criação de um instrumento de cordas? Quanto tempo demora?
Claro que sim! Sintetizando um pouco o processo: tudo começa pela elaboração de um desenho/plano do instrumento. Aqui vão-se estipular as suas dimensões (comprimento, largura e altura), a dimensão da escala, alguns detalhes estéticos que vão fazer do instrumento uma peça única. Depois vão ser escolhidas as madeiras, que diferem consoante o tipo de som que queremos no instrumento. Depois é tudo uma questão de destreza, paciência, simetria, ouvido e sentido estético. A caixa do instrumento é toda “montada”, após dobrar a calor as ilhargas e colar e esculpir as barras harmónicas do tampo e do fundo da caixa! O braço, depois de esculpido, é encaixado na caixa. Depois de colada a escala e colocados os trastes, a guitarra é toda lixada até ficar sem imperfeições e suave ao toque. É envernizada à “boneca” (processo de envernizamento artesanal, que demora alguns dias) com um verniz de fabrico próprio, colado o cavalete, instalados os afinadores, feitas as pestanas em osso e as cordas. O último processo é mesmo o de pôr a guitarra confortável e macia quando tocada, sem nenhum tipo de ruídos parasitas, com um bom timbre e um bom “sustain”.
Esta breve descrição faz parecer o processo de construção de uma guitarra fácil, mas é bastante mais complicado e demoro cerca de dois meses desde a elaboração do desenho e molde da guitarra até instalar as cordas e tê-la a tocar!
Existe algo que identifique uma peça feita por Candido Jacob?
Creio que à primeira vista, uma guitarra que é construída artesanalmente se destaca de outra que é feita em série, em fábrica. As minhas destacam-se pelas formas e tamanhos (guitarras de pequeno e médio formato), pelo tipo de acabamento (goma-laca/óleo) e pela minha assinatura: assino, com um carimbo a quente, o meu logotipo numa chapa de madeira que é colada no fundo da guitarra, onde é visível através da boca do instrumento. Claro, a guitarra também leva a data e a minha assinatura no tampo (visíveis com um pequeno espelho) mas o resultado do carimbo nunca é igual, simbolizando a unicidade de cada guitarra que construo!
Quem costuma encomendar instrumentos de cordas? Algum trabalho mais especial pelo processo de trabalho ou pela pessoa em questão?
As minhas guitarras são apreciadas por muitos músicos que passam pela minha oficina! No entanto, quem acaba por encomendar uma guitarra é quem procura uma guitarra à sua medida, ao seu estilo, uma guitarra imaginada pelo próprio. É quem procura um instrumento de concerto, com um som mais rico e mais complexo. E é aqui que eu entro, que tento dar o som e a estética imaginados pelo cliente, ou mesmo superar a espectativas.
Geralmente quem encomenda é quem já tem algum conhecimento sobre a riqueza destes instrumentos construídos à mão, de como são construídos, e claro, quer ter um instrumento único!
Não tenho nenhum trabalho que seja mais especial do que o outro. Mas procuro sempre superar os trabalhos anteriores com os trabalhos actuais…e por aí sucessivamente! O intuito é poder sempre melhorar e aprender com o tempo e com o processo de construção de maneira a obter melhores resultados, tanto acústicos como estéticos! Por isso são todos muito especiais, pelas mais variadas razões.
Para além do fascínio por este ofício, o que mais está nesta lista? Se não fosse Luthier, o que seria?
Eu cada vez mais tenho a certeza que a minha opção de ter seguido este caminho foi a mais acertada. Não mudaria de ofício e é muito difícil imaginar o que seria se não fosse Luthier, mas se tivesse que imaginar, seguramente teria algum trabalho relacionado com a musica e os instrumentos…sempre tive uma grande admiração e fascínio pelo processo de afinação de pianos.
Uma pessoa para quem gostasse de criar um instrumento de cordas?
É um pouco difícil dizer para quem gostaria de construir uma guitarra, até porque foram muitos os músicos que me influenciaram durante toda a minha vida e são muitos os músicos actuais que continuam a exercer uma forte influência no que faço. Embora impossível, eu gostava de ter construído uma guitarra para o Nick Drake e o Elliott Smith. Também gostaria de construir uma Weissenborn para o Ben Harper já que foi com ele que tive um primeiro “contacto” com a sonoridade da Weissenborn. Estes, entre muitos, são uma constante influência e a sua música tem-me acompanhado ao longo da vida e da minha actividade como construtor.
Entrevista: Ana Suzel
Fotografias: Direitos Reservados Candido Jacob e Peter Forest